sábado, 13 de setembro de 2014

O "Estado Islâmico" e a Selvajaria Humana

Por David Langness.

Deus dotou-nos com intelecto, não com o propósito de nos fazer instrumentos de destruição, mas para que pudéssemos tornar-nos difusores de luz, criar o amor entre os corações, estabelecer a comunhão entre os espíritos e reunir o povo do oriente e do ocidente. ('Abdu'l-Bahá, Divine Philosophy, p. 182)
Não há nada tão desolador e terrível como uma explosão de selvajaria humana! ('Abdu'l-Bahá, Paris Talks, p. 28)
Horrorizado, o mundo viu militantes do recém-formado "Estado Islâmico" no Iraque e na Síria a chacinar milhares de pessoas, e a filmar alguns desses assassinatos em massa e decapitações.

No Ocidente, muitas pessoas que se aperceberam deste tipo de selvajaria culpam o fundamentalismo islâmico, e atribuem-no "àqueles muçulmanos loucos". A comunicação social ocidental raramente dá cobertura aos milhões de muçulmanos pacíficos e devotos, preferindo focar-se numa pequena minoria de militantes armados e terroristas genocidas, que são motivo de notícias mais sensacionais. Revoltada com a crueldade bárbara e abominável dessas acções, e desconhecendo os ensinamentos islâmicos sobre paz e justiça, classificam - errada e injustamente - todos os muçulmanos como um grupo fundamentalista violento.

Militantes do "Estado Islâmico" na Síria
Se o leitor pensa assim, eu posso entender a forma como desenvolveu essa ideia. Mas eu gostaria de argumentar contra esse tipo de reacção, e tentar explicar porque é que isso desvaloriza e destrói a humanidade de milhões de pessoas muito boas, amáveis e pacíficas.

Primeiro, e mais importante, quero dizer que a selvajaria humana e barbárie não são pertença exclusiva de uma etnia, uma nacionalidade ou de um grupo "religioso".

E infelizmente, não faltam provas que demonstrem esse facto.

O genocídio Hutu contra os Tutsi no Ruanda, em 1994; o genocídio nazi nas décadas de 1930 e 1940; o genocídio dos Khmer Vermelhos contra a elite intelectual do Cambodja na década de 1970; o genocídio americano e canadiano contra os índios; o genocídio sérvio contra Kosovo na década de 1990; todos estes exemplos provam que selvajaria humana não pode ser confinada a um grupo. Existem centenas de outros exemplos deste tipo. Massacres brutais, selvagens e desumanos, se eles ocorrem numa hora ou num dia ou ao longo de um século, não são exclusivo dos muçulmanos, dos cristãos, dos judeus ou dos budistas; atravessam todas as barreiras e, ao longo da história da humanidade, quase todos os grupos já foram perpetradores ou vítimas.

Se não podemos identificar as origens desses surtos terríveis de selvajaria numa qualquer etnia, religião, nacionalidade, grupo racial ou ideologia política em particular, então de onde vem ela? E se potencialmente vem de dentro de qualquer pessoa, o que isso diz sobre nós? E se todos nós temos o potencial para a selvajaria, o que podemos fazer sobre isso?

Ian Robertson, professor de psicologia no Trinity College, em Dublin, na Irlanda, e ex-diretor e fundador do Instituto de Neurociências do Trinity College, estudou as origens da selvajaria humana, e, na sua pesquisa, descobriu que esta não pode ser atribuída a qualquer um religião ou ideologia. Na verdade, o professor Robertson diz que, como seres humanos, todos estamos potencialmente propensos a comportamentos selvagens e desumanos. A investigação de Robertson indica que as principais causas da selvajaria incluem os seguintes factores:

  1. Selvajaria gera selvajaria 
  2. Submersão no grupo 
  3. Os extra-grupo como objectos 
  4. A Vingança 
  5. Líderes

Neste pequeno conjunto de ensaios, vamos examinar essas cinco causas da selvajaria, explorar como se podem desenvolver e criar metástases, e, posteriormente, analisá-las através de uma perspectiva espiritual e humanitária dos ensinamentos Bahá’ís, que explicam como entender a selvajaria e o que podemos fazer para pará-la.

O professor Robinson diz:
A primeira parte de uma resposta pode ser terrivelmente simples: a selvajaria gera selvajaria. Brutalidade, agressividade e falta de empatia são respostas comuns de pessoas que foram mal tratadas. Nos campos de concentração nazis, por exemplo, muitos dos guardas mais cruéis eram eles próprios prisioneiros - os conhecidos "kapos". Crianças abusadas sexualmente - especialmente os homens - são mais propensos a tornarem-se abusadores sexuais quando se tornam adultos, embora isso não aconteça com a maioria. As vítimas, por outras palavras, muitas vezes respondem ao trauma tornando-se elas próprias vitimizadoras.
Os abusados, por outras palavras, tornam-se muitas vezes os abusadores. Na vida, quando se sofre abusos terríveis ou violência ou guerra ou condições desumanas na vida, é-se mais propenso a perder a sensibilidade a essas coisas e reconhecê-la nos outros. A investigação mostra que entre trinta a quarenta por cento das crianças abusadas tornam-se abusadores na idade adulta.

Estes dados estatísticos contêm dor e esperança. Dizem-nos que a interrupção do ciclo de selvajaria e abuso pode ser uma difícil tarefa multi-geracional; mas também nos diz que os seres humanos podem conscientemente parar o ciclo, e que muitos conseguem fazê-lo.

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Texto original: The ISIS Crisis and Human Savagery (bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site BahaiTeachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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