sábado, 20 de fevereiro de 2016

Pode a Administração Bahá’í tornar-se um Governo Mundial?

Por David Langness.


Vários pensadores, sábios e filósofos contemporâneos (que não são Bahá'ís) sugeriram que o sistema de organização Bahá'í - uma estrutura eleita democraticamente, unificada, não-politizada e com órgãos de governo locais, regionais, nacionais e internacionais - pode servir como modelo para um futuro governo mundial; ou mesmo, um dia, tornar-se esse governo.

Alfred W. Martin, autor e estudioso da religião Unitária foi um dos primeiros a avançar com esta ideia, no seu livro de 1926 Comparative Religion and the Religion of the Future:
A coroa de glória do movimento Bahá'í é que, enquanto censura o sectarismo na sua pregação, tem praticado fielmente aquilo que pregou, evitando tornar-se ele próprio uma seita... Os seus representantes não tentam impor quaisquer crenças aos outros, seja por argumento ou suborno; em vez disso, preferem colocar crenças que iluminaram as suas próprias vidas ao alcance daqueles que sentem que precisam de iluminação. Não, não é uma seita, não é uma parte da humanidade isolada do resto, vivendo para si própria e com o objectivo de converter todo o resto em material para o seu próprio crescimento; Não, não é isso, mas um fermento, provocando uma fermentação espiritual em todas as religiões despertando-as com o espírito da catolicidade e do fraternalismo... Quem dirá que, tal como o pequeno grupo de viajantes do Mayflower, que desembarcaram em Plymouth Rock, provou ser o pequeno começo de uma poderosa nação, o embrião ideal de uma democracia que, se continuar fiel aos seus princípios, deve ainda alcançar todo o globo habitável, também o pequeno grupo de Bahá'ís exilados da sua casa persa pode ainda vir a ser o pequeno começo do movimento mundial, o embrião ideal da democracia na religião, a Igreja Universal da Humanidade? (pag. 88, 91)
No entanto, as escrituras Bahá'ís proíbem especificamente a Ordem Administrativa Bahá'í de "substituir o governo dos seus respectivos países."

Para eliminar qualquer confusão, 'Abdu'l-Bahá escreveu um tratado importante sobre o assunto chamado Resaleh-ye Siyasiyyeh, que foi traduzido em francês como La Politique (A Política) e em alemão como Eine Abhandlung Uber Politik (Um ensaio sobre Política). Os vários tradutores concordam na essência sobre a força principal deste importante texto Bahá'í: que as funções de líderes religiosos e as funções de líderes políticos devem permanecer separadas. No Seu tratado 'Abdu'l-Bahá afirma claramente que, sempre que os líderes da religião procuram uma função na esfera política, dissolve-se a unidade entre os crentes - e adverte os Bahá'ís não procurarem essas funções.

Mas vamos especular por um momento. E se os crentes ou a religião em si não procurassem essa função? E se a sociedade em geral escolhesse livremente a ser administrada e regida por princípios dessa religião, ou usasse a ordem administrativa religiosa como modelo para o seu governo civil?

Por outras palavras, poderia alguma vez o modelo de governação Bahá'í, a sua ordem administrativa democrática globalmente unificada, tornar-se mais do que apenas um modelo para um governo civil? Poderia a Fé Bahá'í um dia tornar-se a religião de estado de um país? Poderia esse país adoptar as leis Bahá'ís como suas? Poderia uma nação - ou o mundo - verdadeiramente utilizar a ordem administrativa Bahá'í como o seu órgão de governação em algum momento distante no futuro?

Sim, a Casa Universal de Justiça tem dito, que todas essas coisas são passíveis de acontecer, numa etapa futura em que sociedade esteja completamente despolitizada e unificada. Mas os próprios Bahá'ís não podem forçar qualquer uma dessas possibilidades - essa mudança radical no rumo da sociedade teria que ser uma escolha livre e sem constrangimento da própria sociedade. Assim, enquanto uma tal evolução parece agora remota e quase inconcebível, a Casa Universal de Justiça diz que um dia isso pode ocorrer:
Apenas à luz desses factos, é evidente que o crescimento das comunidades Bahá'ís para a dimensão em que um estado não-Bahá'í adoptasse a Fé como Religião do Estado, ou até mesmo a situação em que o Estado aceitasse a Lei de Deus como a sua própria lei e a Casa Nacional de Justiça como seu legislador, deverá ser um processo democrático e absolutamente voluntário. (Separation of Church and State, from The Universal House of Justice, April 27, 1995)
Membros eleitos da Casa Universal de Justiça
Vamos tentar imaginar. Dado um novo modelo pós-secular de harmonia e complementaridade entre uma ordem religiosa pluralista e o Estado, que trabalham de maneiras diferentes para o bem-estar da humanidade; e dado uma comunidade mundial unificada com um sistema federado de nações; e talvez até mesmo dada uma população maioritariamente Bahá'í, (ou que a maioria da população apoiasse os ideais Bahá'ís), então esse "processo democrático e absolutamente voluntário" teria que incluir dois aspectos críticos: protecção completa dos direitos de quaisquer minorias; e o acordo amplo e livre de toda a sociedade futura na adopção de princípios Bahá'ís.

Este tipo de mudança governamental e espiritual sem precedentes - que agora é tão difícil de antever, com o nosso mundo actual tão emaranhado e tão profundamente dividido entre interesses contrários e agendas políticas nacionais - exigiria, obviamente, um grande realinhamento de valores, interesses geopolíticos e perspectivas religiosas. Salvo uma mudança abrupta ou catastrófica nos destinos do mundo, levará provavelmente muito tempo, talvez séculos, para chegar à fase de maturidade humana colectiva necessária para tal acordo pacífico e democrático sobre um conjunto unificador de princípios espirituais.

Enquanto isso, o principal objectivo da Fé Bahá'í, independentemente da forma como isso acontece ou como poderá vir a acontecer, foca-se um objectivo final - a unificação pacífica de toda a raça humana.

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Texto original: Could the Baha’i Administration Ever Become a World Government? (www.bahaiteachings.org)

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David Langness é jornalista e crítico de literatura na revista Paste. É também editor e autor do site bahaiteachings.org. Vive em Sierra Foothills, California, EUA.

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