sábado, 11 de abril de 2015

Os Bahá'ís e a Doutrina da Encarnação

Por Tom Tai-Seale.


A palavra "encarnação" significa literalmente "entrar na carne".

Num contexto religioso, a encarnação normalmente significa que Deus desce do céu e torna-Se humano. Os Baha'is não acreditam na doutrina da encarnação. Mas muitos Cristãos acreditam. Mas o que é a doutrina da encarnação? Vamos examiná-la e ver o que ali se encontra.

Para sermos justos, a doutrina da encarnação é controversa mesmo dentro do próprio cristianismo. É uma doutrina difícil enunciar de forma precisa, ainda mais difícil de interpretar correctamente, e é impossível saber se a interpretação "correcta" é realmente correcta. Por exemplo, se um cristão aceitar o significado mais óbvio e explicar que a encarnação significa que Deus assumiu a forma de Jesus (e mais tarde do Espírito Santo), esse cristão seria herético, pois este conceito, conhecido como Sabelianismo, foi condenado pelo cristianismo.

Para esclarecer a questão, um teólogo cristão moderno, Francis Young, escreve:
A simples equação Jesus = Deus não só é incapaz de descrever o que a tradição cristã tem afirmado, mas é manifestamente estranha. Para reduzir tudo o que é Deus a uma encarnação humana é virtualmente inconcebível, facto para o qual doutrina trinitária é a resposta tradicional. (The Myth of God Incarnate, p. 35)
Uma coisa errada no conceito de Jesus = Deus é que implica que o próprio Deus sofreu e morreu. O conceito deixa-nos a pensar como é que Deus (Jesus) administrava os assuntos do universo do Seu trono terreno; e porque é que o Novo Testamento parece a querer manter uma distinção entre eles (i.e., entre Pai e Filho)? Em última análise, quase todos os cristãos rejeitam o conceito de Jesus = Deus, porque de facto não é um conceito cristão. A doutrina Cristã é muito mais complexa e está interligada uma série de outros conceitos. Vamos ver as raízes bíblicas do conceito encarnação. Maurice Wells, um teólogo cristão escreve:
Encarnação, no seu sentido pleno e correcto, não é algo que esteja directamente apresentado nas escrituras. É uma construção sobre diversas evidências que ali se encontram. (Ibid, p.3)
As raízes desta crença encontram-se em frases dispersas no Evangelho que mais tarde foram moldadas por líderes religiosos e teólogos no conceito de encarnação, e, posteriormente, se fundiu com outras ideias para formar uma doutrina complexa sobre a natureza de Cristo. E quando esta doutrina se tornou oficial, mudou a natureza do Cristianismo, tornando muito difícil aos Cristãos a aceitar qualquer Profeta ou Manifestante de Deus mais recente.

Muitas, ou mesmo a maioria, das grandes religiões mundiais passou gradualmente por este processo. Aqui está um esboço geral do seu funcionamento: o Profeta aparece e transmite uma mensagem que une as pessoas, apelando à sua natureza superior e às suas capacidades espirituais. Posteriormente, após o Profeta e fundador da nova religião deixar este mundo mortal, surgem as autoridades - geralmente sob a forma de sacerdotes ou algum tipo de clero. Aos poucos, emerge uma instituição clerical que limita as crenças oficiais, muitas vezes centrando-se em definições misteriosas que têm por efeito redefinir, re-interpretar, e, por vezes, re-inventar os ensinamentos do Profeta. Por fim, a classe clerical encontra maneiras de diferenciar a sua fé acima de todas as outras, proibindo-as ou desacreditando-as ao longo do tempo.

A encarnação é um dessas re-invenções. Se olharmos cuidadosamente para as próprias palavras de Cristo, conforme registadas no Evangelho, vamos perceber que a noção de encarnação nunca foi afirmada durante a vida de Cristo.

Os ensinamentos Bahá’ís dizer claramente que a noção da encarnação é uma metáfora, não uma verdade literal. Quando perguntaram a 'Abdu’l-Bahá: "Qual é a relação de Cristo e Bahá'u'lláh com Deus?", ele respondeu:
Sua Santidade Cristo disse: "O Pai está em mim." Devemos entender isto com evidências lógicas e científicas, porque se os princípios religiosos não estiverem de acordo com a ciência e a razão, eles não inspiram o coração com confiança e segurança... Vamos, livres das tradições do passado, investigar a realidade deste assunto. Qual é o significado do pai e do filho?

Esta paternidade e filiação são alegóricas e simbólicas. A realidade Messiânica é semelhante a um espelho através do qual o sol da divindade se torna resplandecente. Se este espelho afirma "A luz está em mim", então é sincero na sua afirmação; Jesus, portanto, foi sincero quando disse: "O Pai está em mim." O sol no céu e do sol no espelho são o mesmo, não são? E no entanto, nós vemos que há, aparentemente, dois sóis. (Divine Philosophy, p. 151-152)

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Texto Original: Baha’is and the Doctrine of Incarnation (bahaiteachings.org)

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Tom Tai-Seale é professor de saúde pública na Texas A&M University e investigador de religião. É autor de numerosos artigos sobre saúde pública e também de uma introdução bíblica à Fé Baha'i: Thy Kingdom Come, da Kalimat Press

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