domingo, 1 de fevereiro de 2015

Repensar a Trindade

Por Tom Tai-Seale.



Se desejamos reconciliar as religiões - encontrar alguma forma de alinhar mental e espiritualmente os seus Profetas e propósitos - temos que considerar o conceito cristão de Trindade.

A maioria dos Cristãos foi ensinada a acreditar na Trindade. Eu cresci a afirmar essa crença em cada serviço religioso a que assistia. Mas o que é que a trindade - a noção de um Deus trino - significa para os Cristãos? Podemos perceber que Trindade significa muitas coisas diferentes.

É claro que Jesus Cristo nunca ensinou qualquer conceito sobre Trindade; isso surgiu muito tempo depois do Seu martírio. A controvérsia trinitária surgiu no século III e ainda hoje agita os Cristãos. Ao reflectir sobre esta controvérsia teológica, o historiador Sócrates (não confundir com o filósofo pré-cristão) escreveu: “A situação parecia exactamente uma batalha nocturna, pois ambos os lados pareciam estar às escuras quanto às bases em que usavam para se atacarem uns aos outros” (citado em Early Christian Doctrines J.N.D. Kelly, Harper and Row, 1978, p. 239). Para muitos, a noite permanece, pois o significado de Trindade continua oculto numa estranha estrutura de palavras e conceitos.

E porque a Trindade é um conceito muito complexo, até os bons e fieis Cristãos cometem erros e distorcem coisas quando tentam descrevê-lo. No entanto, isso tem pouco efeito na alma ou na fé de qualquer pessoa. A Trindade é uma doutrina, uma construção mental que tem pouco a ver com a salvação.

A evolução da doutrina cristã da Trindade atravessou várias etapas, enquanto muitos estudiosos e concílios realizados em diferentes cidades debatiam e reagiam contra os significados e as diferenças dos termos difíceis; a doutrina aprovada oficialmente foi aquela que mais agradava ao imperador. A primeira doutrina trinitária a receber a aprovação imperial tomou forma no ano 325 EC, numa cidade da Ásia Menor chamada Niceia - não longe de Constantinopla. Niceia foi o local de uma conferência de bispos, convocada pelo Imperador Constantino. As traduções diferem ligeiramente, mas uma versão comum do credo de Niceia declara:
O Imperador Constantino,
rodeado pelos Bispos no Concílio de Niceia
Cremos em um só Deus, Pai Todo-Poderoso, criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis.

E em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, unigênito do Pai, da substância do Pai, Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai; por quem foram criadas todas as coisas que estão no céu ou na terra. O qual por nós homens e para nossa salvação, desceu (do céu), se encarnou e se fez homem. Padeceu e ao terceiro dia ressuscitou e subiu ao céu. Ele virá novamente para julgar os vivos e os mortos.

E (cremos) no Espírito Santo.

E quem quer que diga que houve um tempo em que o Filho de Deus não existia, ou que antes que fosse gerado ele não existia, ou que ele foi criado daquilo que não existia, ou que ele é de uma substância ou essência diferente (do Pai), ou que ele é uma criatura, ou sujeito à mudança ou transformação, todos os que falem assim, são anatematizados pela Igreja Católica e Apostólica.

(Early Christian Doctrines J.N.D. Kelly, Harper and Row, Publishers, 1978, p. 232)
O credo específica como ortodoxa a crença num único Deus, num único Senhor (Jesus Cristo) e no Espírito Santo.

Apesar da aprovação do Imperador, o Credo de Niceia não pôs fim às discussões sobre o conceito cristão de Deus. De facto, o Credo apenas identificou os três elementos da Fé Cristã: Deus, Jesus (o Seu Mensageiro) e o Espírito Santo. As questões mais difíceis sobre a definição das três componentes e a forma como interagem ficaram reservadas para credos posteriores e as discussões continuam até hoje.

A perspectiva Bahá’í sobre esta questão começa por apresentar uma visão mais ampla sobre a própria religião. As Escrituras Bahá’ís salientam que a religião é, inevitavelmente, alterada quando os seres humanos tentam modifica-la e adaptá-la ao seu próprio gosto.
No início todas as grandes religiões eram puras; mas os sacerdotes, dominando as mentes das pessoas, encheram-nas com dogmas e superstições, de modo que a religião gradualmente se tornou corrupta ('Abdu’l-Bahá, 'Abdu’l-Baha in London, p. 125)
Vamos ver como é que este processo pode ocorrer, até àqueles que têm as melhores intenções.

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Texto Original: Re-examining the Trinity (bahaiteachings.org)

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Tom Tai-Seale é professor de saúde pública na Texas A&M University e investigador de religião. É autor de numerosos artigos sobre saúde pública e também de uma introdução bíblica à Fé Bahai: Thy Kingdom Come, da Kalimat Press.

1 comentário:

Vale da Busca disse...

O autor está correto. Contudo penso que como bahá'ís devemos enfatizar aos trinitarianos que o próprio Deus (Jeová, Alá) diz claramente e se revela como Uno e Único. Nós baháis não devemos temer isso, pois Muhammad e o Alcorão proclama isso há 14 séculos. Há mais monoteístas puros no mundo do que trinitarianos. Esta Unidade e Unicidade do Grande Ser é lógica e esta logicidade que distingue o monoteísmo do politeísmo. A trindade é histórica e incognoscível, irracional. Os que a desenvolveram parece que tinham mais referencias pagãs de imperadores divinos e deuses materializados e antropomórficos do que com a teologia abraâmica. Nenhum concílio dos mais sábios e eruditos homens da história da humanidade jamais teria capacidade ou autoridade para determinada a natureza e essência do Deus Eterno. Ele próprio, tão somente, tem o legítimo direito de se auto-descrever, de se auto-definir, de se auto-conceituar. Glorificado e Exaltado é acima da compreensão humana de abranger seu Ser. O conhecemos apenas pelo que ele manifesta e se revela e por meio dos seus atributos e pelos mensageiros e profetas.